quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Encontrando forças

Aviso desde já, que nos próximos tempos isto se vai tornar um blog muito deprimente. Eu escrevo porque isso me faz sentir melhor.

Se me encontro, apenas 5 dias depois do que aconteceu, um pouco melhor e já com forças para passar um dia inteiro sem chorar de 5 em 5 minutos, é graças ao F. Os meus amigos também me têm dado muita força e a G., por exemplo, muito me tem distraído e desanuviado a minha cabeça; mas o F. é quem me vê sem ilusões de óptica. As outras pessoas vêm o meu rosto mais sério e estranham não andar na parvoeira do costume, mas o F. percebe como tudo me dói. É ele que, por mais do que uma vez, agarrou nos cacos que restam da minha alma, e com muita atenção e paciência, me vai reconstruindo aos poucos.

O meu pai disse-me que quando eu era pequena um dia disse que sentia a falta da minha mãe e que o meu pai disse que ele era pai e mãe e que nada me faltava. A minha resposta foi: falta o carinho de mãe! De certeza que isto o magoou profundamente. Mas uma pessoa quando é criança não tem filtro e diz tudo o que pensa no momento. E quando eu era criança, a pessoa que realmente assumiu esse papel de dar o carinho que uma mãe dá, não foi o meu pai e sim o meu avô. É por isso que, sim, eu sei que o meu velhote tinha já 87 anos; que já não tinha, praticamente, momentos lúcidos e que quando os tinha chorava e pedia para morrer (pois imaginem o duro que é ser-se toda a vida o homem mais expedito e mais trabalhador que alguma vez se conheceu, e subitamente, aos 87 anos ver-se dependente de outros e sem conhecer quem o rodeia). Eu sei que ele, até o ano de 2012 teve, na medida do possível, uma boa vida. Amou, perdeu, venceu, teve filhos, perdeu uma filha, teve netos e bisnetos, foi adorado por todos quanto o conheceram, viu o mundo e trabalhou, como ninguém, por gosto. Sem medo foi para França - sem falar uma palavra de francês e deu o seu melhor. Aprendeu a falar francês de tal modo que ainda hoje o falava. Sem pensar duas vezes, foi para Inglaterra - sem falar uma palavra de inglês. Porque ele sabia que o mais importante era conseguir trabalhar. Conseguir pôr o pão na mesa. Deu sempre o melhor de si, sem nunca esperar nada em troca.

Sim, eu sei que o meu velhote tinha já 87 anos e que ainda tenho um pai que me ama e um F. que me faz acreditar que existe um Deus, e poucos mas excelentes amigos; mas sinto-me como se tivesse perdido a minha mãe uma segunda vez. Porque os dois eram iguais. A mesma alma pura. Amados por todos quanto os conheciam. E se me dói, é porque não percebo, porque raio são sempre os Bons os primeiros a ir.

Encontrei na internet uma frase que me ajudou a passar ao próximo passo da fase do luto:

"A Morte deixa um vazio que ninguém pode sarar. O Amor deixa uma memória que ninguém pode roubar".


terça-feira, 25 de dezembro de 2012

Árvore Desfolhada

Houve um momento em que fiquei totalmente sozinha, sentada defronte do homem que marcou tanto a minha, não longa vida, mas infelizmente já muito marcada por momentos destes.

Houve um momento em que fiquei totalmente sozinha, e o tempo parecia ter parado.

Como sempre, consigo expressar melhor o que sinto, através da escrita. Bem mais do que a expressão oral. Não que seja excepcional a fazê-lo, mas de qualquer das formas, ajuda-me a ultrapassar as coisas. Por isso, houve um momento em que fiquei totalmente sozinha, e peguei na caneta e em papel:


Uma árvore desfolhada que perdeu um dos seus ramos mais fortes. Uma árvore desfolhada, sem força para sequer amparar os pequenos pássaros que voam livremente tocando o nascer do sol. Uma árvore desfolhada, com o tronco oco.

As raízes perdem a sua profundidade. Já pouco existe para agarrar.

A meu lado o sol segue o seu curso. Como pode ele seguir o seu curso? Quando a razão pela qual ele aquecia a Terra, não existe mais? Como pode ele seguir o seu curso, quando a Voz que ele ouvia, se calou para sempre?

Ao ver-te deitado; as tuas rugas, cada qual com a sua história; as mãos fortes e negras que tanto trabalharam, pela primeira vez imóveis; os teus olhos tão expressivos, para sempre fechados... o meu ser dissolve-se no ar.

A minha árvore perde as suas folhas. O tronco perde a sua força. Metade do tronco seca. E fico assim. Para sempre recordando-me do que fui, do que era e do que nunca voltarei a ser. O vazio que deixaste não poderá, jamais, ser preenchido. Novos ramos nascerão, eventualmente, e os que sobreviveram mais força, talvez, terão. Mas o pedaço que de mim foi arrancado, jamais poderá sarar.

A meu lado o sol segue o seu curso. Deveria segui-lo também, mas as raízes ainda não têm força...

segunda-feira, 24 de dezembro de 2012

Dormente

Há 19 anos que o dia 21 de Dezembro é uma tortura por causa do que aconteceu, tinha eu 8 anos. Era eu uma criança quando o meu mundo se despedaçou a primeira vez. Fiquei sem a minha mãe.

A primeira pessoa a confortar-me foi o meu avô. O meu avô que tinha perdido a filha e teve que viajar 280km à pressa para chegar a Lisboa e ajudar nos piores preparativos da sua vida, a primeira coisa que fez quando chegou foi perguntar onde eu estava e ir ter comigo para me dar um beijo e um abraço.

Toda a minha vida o meu avô foi a pessoa que eu mais gostava. É duro dizer que o punha à frente do meu pai que tanto sacrifício fez para me dar tudo, mas honestamente, creio mesmo que ele esteve sempre em primeiro lugar, desde que perdi a minha mãe. Amo o meu pai com todas as minhas forças, mas foi sempre o meu avô que me confortou nos piores momentos. Sempre fui a sua menina. A sua princesinha.

Esta sexta-feira fui acordada às 07 da manhã por um telefonema. Estava tão adormecida, ainda, que até desliguei a pensar que era o despertador. Quando liguei de volta ao meu pai, ele deu-me a noticia. O meu velhote morreu durante o sono.

Novamente o 21 de Dezembro serve para destruir o meu mundo. A data está mesmo amaldiçoada. Doi-me ver todos os posts que há no facebook a gozar com o fim do mundo, que afinal não chegou, quando para mim chegou mesmo.

Ainda hoje, dia 24 dou por mim toda a tremer. Desde dia 21 que não faço outra coisa a não ser chorar. Só me apetece chorar e dormir. Até mesmo comer, só obrigada é que consigo fazê-lo. O F. disse-me logo para não deixar de vir ao trabalho, porque sempre ocupo a cabeça com outras coisas. Foi difícil para mim retomar a vida, porque como raio posso eu retomar a vida se sempre que fecho os olhos recordo-me dos momentos que tive com o meu velhote? Das suas frases emblemáticas. Dos passeios que fazíamos? Mas a verdade é que hoje, ao estar aqui, não me sinto melhor, mas ao menos ainda não desatei a chorar. Hoje, sinto-me apenas dormente. Como se me tivessem arrancado um pedaço de mim.

Espero melhorar aos poucos.

Mas começo a odiar o Natal.